segunda-feira, 22 de novembro de 2010

1- metro - sexual precoce

Quando o sinal sonorose fez ouvir e a voz mecânica anunciou a estação naquela língua que me era estranha surgiu nono meu horizonte visual uma figura elegante. Primeiro de perfil, tinha acabado de se levantar e logo se virando suavemente mostrando o final das suas costas e do rabo. Uma forma que eu distinguia entre as demais naquela amontoada carruagem de metro preenchida com casacos, malas e guarda-chuvas desinteressantes. Ainda a observei a caminhar dois ou três calculados passos até desaparecer por detrás de uma gabardine negra. Naquele momento fugaz não lhe vira o rosto ou sequer a peculiaridade de qualquer traço singular e identificativo. Voltei a dirigir a minha atenção para o diagrama em língua inglesa que segurava nas mãos e percebi que deveria sair na próxima paragem, um nó de conexão da linha. Uma vez aí chegado a carruagem esvaziou-se de quase todas as pessoas e eu inevitavelemente tentava decifrar o cirílico em busca da direcção que buscava. Acabei por seguir por um lado sem ter a absoluta certeza e é ainda a arrumar atabalhoadamente os papéis e notas e mapas que ao virar a esquina reconheço ou penso reconhecer a silhueta que há pouco vira. Subia nas escadas rolantes e parecia-me pairar no ar. Na realidade poderia tratar-se de outra pessoa, eu não tinha como comprovar a sua identidade. No entanto a curiosidade espicaçava-me e decido subir as escadas a passo e tentar conquistar os traços distintivos do seu rosto. A dois degraus de distância, hesito, abrando a velocidade da passada e começo a olhar de soslaio vendo a maçã do rosto branca, emoldurada pelos cabelos um misto de loiro e ruivo. Os olhos pareceram-me cinzentos e quando me aproximava para me certificar receie cruzar o seu olhar e segui em frente. Tive a sensação de ela me observar agora a mim. Talvez por não ter sido suficientemente discreto ou pelo meu ar evidentemente estrangeiro. Virei-me para trás e o meu olhar foi magneticamente atraído para os olhos azul-cinza de forma amendoada que me fitavam desafiadoramente. Fiquei perplexo por uns momentos e a minha falta de reacção fez com que ela abrisse ainda mais o seu sorriso. Tinha conseguido o que queria naquele instante. Aquele encontro poderia até não ter passado dali mas algo precipitou o que se passou a seguir. De repente as luzes apagaram-se e apenas ficaram acesas as luzes das saídas de emergência. Senti uma mão a agarrar a minha e a puxar-me, vislumbrava apenas um vulto à minha frente. O toque daquela mão agradava-me. Era suave e nem posso dizer que me segurasse com muita força, mas eu ia, deixava-me ir. Entrámos por uma porta mesmo onde indicada uma saída de emergência ela rodou sobre si mesma e virou-se para mim mal entrámos.Enquanto lá fora já se começava a escutar o ruído das pessoas tacteando o caminho até à saída eu sentia os seus seios de encontro ao meu peito e o hálito quente da sua boca junto à minha. Instintivamente encostei as minhas costas com mais força à porta segurando ao mesmo tempo a sua cintura com firmeza. As minhas mãos pareciam moldar a sua cintura, os polegares na frente encaixados no vão do espaço logo abaixo da costela flutuante e os restantes dedos em volta das costas contornando os seus dorsais ginasticados. Puxei-a mais para mim sentindo o peso do seu corpo incidir ainda mais sobre o meu peito, na minha barriga, na cintura e nas coxas. Ela parecia querer colar-se a mim. Depois agarrou-se às minhas omoplatas beijando-em furiosamente, arfando, como se a sua língua buscasse também ela uma saída para todo o desejo se encerrava no seu corpo, nos seios, nas nádegas, nas virilhas, no seu sexo que eu já adivinhava húmido. As minhas começaram então a percorrer o seu corpo sofregamente, primeiro descendo, segurando-lhe ambas as nádegas e fazendo com que ela se levantasse e nunca me deixando de beijar , coma a cara à altura da minha, indireita-se o pescoço. Depois largando-a segurei-lhe nas mamas enquanto ela descendo as suas mãos me apalpou o rabo com força chegando-se ainda mais perto de mim. Nesse momento ela resolve levantar a perna e começar a roçá-la entre as minhas, primeiro suavemente mas à medida que se ia excitando cada vez aumentava mais o ritmo e a intensidade. Lá fora ouviam-se os sons de vozes abafadas e desconexas e a porta de ferro da saída de emergência a ser uma e outra vez forçada. A dada altura alguém mostrou-se mais persistência. Insistiu uma, duas, talvez três vezes, talvez mais, eu deixei de escutar. Já não aguentava o pénis erecto dentro das calças e a dor e prazer que a fricção da sua coxa me causava. Movi uma das minhas pernas para trás da que ela tinha no chão e fi-la deitar no chão do compartimento. Mal pousei as mãos no solo uma matéria viscosa e quente agarrou-se-me às mãos e um cheiro intenso invadiu-me as narinas. Os meus dois joelhos ficaram também húmidos e além do mais não tinham modo de se fixarem no solo. Sentia-a relaxar-se debaixo de mim, ria-se até e abriu os botões da camisa descobrindo os seios. De seguida os seus braços caíram para o lado afundando-se ligeiramente no que ao tacto parecia ser uma espécie de óleo se bem que o intenso odor não o confirmasse de modo evidente. Talvez sentindo a minha hesitação ela voltou a mover uma das suas pernas e deixando-me ainda mais desequilibrado fez-me cair ainda mais sobre ela. Sentia a sua pele macia e quente e o seu odor confundindo-se com aquele cheiro forte. Os meus lábios avidamente descobriam o sabor dos seus mamilos. Colei-os a um deles, o esquerdo, por ter sido sobre esse que caíria o meu rosto e por considerar ser este seio o maior dos dois quando minutos antes eu os havia apalpado. Com a língua desenhei roscas na pele eriçada do mamilo e misturava a minha saliva com o suor da sua pele. As mãos dela aproximaram-se de mim e começarama a habilidosamente e desenvecilharem-me das minhas calças e cuecas. Ao tentar ajudá-la perdi ainda mais os meus pontos de apoio e tendo escorregado ainda mais vejo-me deitado de lado humedecendo assim as minhas costas de lado. O tempo a partir daí parou, comigo a contemplá-la e ela estática.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

De Pernas abertas, mas quase a fechá-las!

Novo Curso na Escrever Escrever
8- 15- 22-29 de Novembro
Inscrições abertas, mas quase fechadas...venha descobrir-se connosco e viver o prazer na ponta dos dedos, no bico da caneta - na Escrita Erótica

Descubra muito mais na Escrever Escrever

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Projecto Teia - Ciclo sobre Amor e Sexualidade

SALÃO NOBRE do TEATRO D. MARIA

Numa selecção que tem como temas agregadores o Amor e a Sexualidade, escritores portugueses escolhem entre poemas, contos e prosa de toda a literatura, as palavras que nos falam do desejo, de sensibilidades e de histórias que expressam diferentes maneiras de viver a manifestação dos afectos no nosso corpo e na relação com o outro. Actores profissionais dão expressão às palavras.


público em geral | entrada livre | duração 1h30 aproximadamente

Transexualidade
12 Out | 19h | Salão Nobre

selecção de textos Filipa Melo
coordenação da leitura Romeu Costa

Amor Platónico
21 Dez | 19h | Salão Nobre

selecção de textos Nuno Júdice
coordenação da Leitura Carla Chambel

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Primeira Vez


Foi num entardecer de finais de Verão que tudo aconteceu.
Eu estava de férias em casa de uns primos.
No grupo daquele ano em particular, em que uns estavam a sair da adolescência e outros ainda plenamente mergulhados nela, encontrava-se também Bernardo, um amigo deles que viera do Norte e que eu não conhecia.
Bernardo era um rapaz grande, um nadador exímio e detentor de uma jovialidade contagiante. Tinha uns olhos verdes, límpidos e sorridentes, um cabelo castanho-cobre povoado de caracóis perfeitos, como se tivessem sido esculpidos e uma voz de tenor, vibrante, rica e melodiosa.
Bernardo ria e brincava com todos, excepto comigo. Sem deixar de ser cordial, tratava-me com um certo distanciamento. Eu ia pensando em inúmeras razões para esta realidade... pensei que se devia ao facto de eu ser um ou dois anos mais novo e de não estar ainda na faculdade... ou que tudo tinha a ver com a minha falta de destreza para os desportos em geral, aliada a uma crónica inibição verbal para a socialização imediata... ou possivelmente que se tratava da frieza a que já estava habituado por parte das outras pessoas devido à minha aparência andrógina
Como não conseguia alcançar uma resposta resignei-me a ficar mais uma vez na sombra de todo aquele convívio saudável, onde também entravam belas desconhecidas de cabelos longos e brilhantes e rapazes esculturais de olhar magnético. Contemplava-os à distância, lindos e sorridentes em fatos de banho coloridos e com toda a sensualidade insinuante e descuidada da juventude em pleno desabrochar.
No dia em que tudo aconteceu, lembro-me que estava sozinho, como habitualmente. Acho que todos tinham ido buscar o jantar a uma churrascaria e que iriam demorar um pouco. Todos, excepto Bernardo, que ficara na praia a conversar animadamente com uns turistas alemães.
Lembro-me ainda de estar dentro de água e da praia inundada pela luz dourada do sol, dos vultos ao longe, das ondas a embalarem-me o corpo suavemente e da sensação das pontas dos dedos dos pés tocando ao de leve a areia semeada de escolhos, ora polidos ora cheios de arestas acutilantes.
Depois havia florestas de algas que se insinuavam secretamente em manchas escuras e me enlaçavam suavemente. O temor inicial de ser arrastado por elas para o fundo do mar foi substituído por uma sensação de torpor. Era como um jogo de cabra cega em que centenas de dedos me tocavam inesperadamente na pele, povoando-a de reflexos inacabados e de apelos mudos e insondáveis. Senti o fato de banho a descair debaixo de água e retirei-o. Fechei os olhos e deixei-me envolver e acariciar.
A certa altura uma sensação de terror invadiu-me ao aperceber-me que o fato de banho me escapara das mãos. Já não havia muita gente na praia, mas como percorrer o areal até casa sem dar nas vistas? A distância não era longa mas parecia inalcançável com este contratempo. Nunca tinha estado sem roupa desta maneira.
Permaneci uns momentos voltado para a praia com a água pela cintura e acariciando os braços inconscientemente, sem saber o que fazer. Depois, num ímpeto irracional, saí da água e corri com toda a força em direcção a casa. Sentia a aragem fria petrificar-me a pele, os cabelos pesados e molhados a soltarem-se em lascas, os mamilos endurecidos e o sexo solto balouçando entre as pernas.
Felizmente, ao chegar, a porta estava aberta.
Entrei ofegante e parei por uns momentos a descansar. As venezianas estavam semi-cerradas e a luz da sala de entrada era diáfana, quente e macia como uma carícia secreta e apaziguadora.Vi de relance a minha imagem no espelho da entrada e por momentos não me reconheci na minha nudez. O meu corpo, que todos criticavam silenciosamente por não ser cem por cento masculino, exibia-se ali pleno, curvilíneo e sem equívocos. Pela primeira consegui amá-lo.
Subi as escadas rumo ao quarto. Primeiro a correr para me esconder. Depois voltei a descê-las e a subi-las, desta vez lentamente. A sensação do corpo liberto de roupas e das nádegas a roçarem uma na outra a cada degrau dava-me uma sensação de prazer que nunca sentira antes e queria prolongá-la enquanto pudesse, longe dos que estavam para vir e que poderiam chegar a qualquer momento.
Já no quarto peguei numa toalha e comecei a secar-me, perscrutando a praia pela janela, atrás das cortinas. Ao voltar-me vi um vulto à porta do quarto. Primeiro pensei, assustado, que se tratava de uma alucinação provocada pelo encadeamento da luz da janela. Depois percebi que Bernardo estava realmente ali, os calções de banho molhados e colados às pernas e o cabelo deitando pingos de água que caíam pelo corpo.
- Aconteceu alguma coisa? – Perguntou ele – Vi-te a correr para aqui sem fato de banho...
- Não... nada... – respondi eu, colocando a toalha em frente ao sexo e esperando, de olhos postos no chão, que ele se fosse embora.
Mas ele não se foi embora.
Em vez disso, entrou no quarto, fechou a porta delicadamente e, quando eu me dirigi a ela para fugir rumo à casa de banho com o intuito de encontrar um refúgio para o meu embaraço, ele segurou-me o braço. A mão era grande e musculada, mas o toque era como de quem segura em algo frágil que não quer quebrar. A toalha caiu no chão. Quando os seus dedos me elevaram o rosto, os nossos olhares fixaram-se. Vi-lhe então as pupilas dilatadas e soube que o seu desejo era genuíno e intenso. O calor que o seu corpo emanava era quase palpável e sentia-o como se me atravessasse a pele. Percebia o seu cheiro sem o saber definir e a rigidez inicial sentida por mim foi dando lugar a uma espécie de languidez extática que nunca sentira antes. Cada toque assinalava a materialização de diferentes partes do meu corpo. Abraçámo-nos longamente. Não sabia o que fazer, por isso limitava-me, no início, a mimetizar. As suas mãos acariciavam-me a nuca, costas, glúteos e iam penetrando mais intimamente, os dedos massajando ao de leve em redor do ânus. Sentia o seu sexo roçar entre as minhas pernas.
Depois, afastando-me suavemente, acariciou-me os mamilos, agora inchados, com os polegares e lambeu-os longamente. Fechei os olhos. A sensação era tão inebriante e intensa que gemi. Ele parou e ergueu-se, temendo ter-me magoado.
Ao abrir novamente os olhos, observei uma gota de água prestes a cair do seu lóbulo direito e apeteceu-me sorvê-la. Senti o seu sabor intenso e os meus lábios procuraram mais gotas pelo rosto, pescoço, ombros, peito, linha alba, ventre, chupando-as lentamente, saboreando cada uma, sempre na expectativa ávida e sôfrega da próxima. Acariciei-lhe os tornozelos, subindo pelas pernas e coxas. Não me atrevi na zona do sexo. Apercebendo-se da minha timidez, ele soergueu-me pelos ombros, baixou os calções e colocou o pénis rijo na minha mão. Acariciei-o sentindo as veias dilatadas sob a pele e o calor fremente. Depois, passando o braço sobre os meus ombros e puxando-me contra si, encostou a sua glande à minha e com a mão acariciou-as simultaneamente, de forma ritmada. Um fervor de excitação ia aumentando gradualmente e a sensação de prazer subsequente foi tão intensa e dilacerante que tive de me abraçar a ele para não sucumbir e cair. Ficámos uns instantes abraçados, mudos, até que ouvimos alguém lá em baixo que acabara de chegar. Ele vestiu os calções à pressa, beijou-me a testa e saiu do quarto antes que alguém entrasse. Tentei roubar-lhe um beijo nos lábios, mas este não se concretizou. O meu corpo estremecia não só pelo que se passara mas também pelo sentimento de insatisfação que se começava a insinuar. Sentia-o arrefecer paulatinamente e antes de me decidir a fazer o que quer que fosse para sair daquela experiência iniciática fiquei uns instantes a contemplar uma via láctea de sémen espraiada pelo chão.
A.F.

Chá e muita Simpatia

Eduardo não gostava de ir às longas visitas em casa da tia Briolanja. Por isso, um dia, ele pediu-me para o acompanhar.
Nunca namorámos verdadeiramente. Éramos uma espécie de objets de plaisir um do outro e tínhamos uma intimidade sensual e infantil.
A tia era uma senhora majestosa com uma meticulosidade muito própria em todos os rituais sociais, o que requeria tempo, disponibilidade e paciência. Fazer-lhe uma visita implicava longas esperas, circunlóquios e divagações, o que poderia durar horas.
Durante todo o caminho para casa da tia, Eduardo e eu íamo-nos provocando mutuamente.
Ele tentava passar-me rasteiras… ou escondia-se entre as árvores das alamedas desertas para aparecer inesperadamente um pouco mais à frente.... ou imobilizava-me de encontro às paredes de ruelas obscuras para meter a mão debaixo da saia do meu vestido de algodão, beijar-me o pescoço e acariciar-me o clitóris com um dedo hábil e insistente.
Eu fazia-lhe cócegas, abria-lhe a braguilha, passando a mão pelo membro rijo que espreitava e fugia a seguir, tentando escapar em vão às suas mãos e às retaliações lúbricas que ele me infligia e que, por vezes, me iam provocando pequenos orgasmos.
Finalmente chegámos a um palacete rosa e branco de dois pisos e tocámos ao sininho de entrada. Durante os dez minutos de espera, encostados a uma árvore frondosa do passeio, praticámos toda uma série de linguados. Ele apalpava-me os seios e eu enterrava as mãos por entre as calças rumo às nádegas que se contorciam. Felizmente ninguém passou na rua, porque seríamos certamente presos por atentado à moral pública.
Ao ouvirmos a porta abrir, parámos subitamente e com a compostura descarada habitual, Eduardo saudou Emília, a rapariga de serviço e beijou a tia no rosto. Apresentou-me como uma amiga de longa data e eu fui cumprimentada com dois beijos dados no ar.
A tia Briolanja caminhava auxiliada por uma bengala de homem com castão de prata e no todo parecia uma personagem parada no tempo, algures nos anos 30 ou 40. Usava um vestido em seda lilás com um corte impecável e os cabelos eram branco prata, ligeiramente ondulados, presos atrás com uma travessa em tartaruga. O que mais me fascinou foi o colar de pérolas que usava nesse dia, de várias voltas e rematado com um fecho onde reluzia uma água marinha. Não sei porquê mas imaginei-a jovem e nua no meio de um boudoir, usando apenas aquela jóia e posando para alguém depois de uma sessão de sexo tórrido, secreto e silencioso numa casa insuspeita, repleta de gente bem comportada e vigilante.
Na sala profusamente decorada como um postal de Natal da época vitoriana, Eduardo e eu fomos sentados num sofá de brocado de cetim cinza com apliques florais em veludo (uma combinação inusitada mas de bom gosto, pensei eu).
À frente do sofá estava a mesinha de chá com as chávenas de porcelana, um prato com pastéis de nata e um outro com um bolo pequeno e redondo coberto de creme moca polvilhado de confetis de açúcar coloridos.
Eduardo sabia que eu gostava de bolos com creme e tinha o hábito de me lamber a boca quando eu estava a comer um. Ao ver a mesa posta sorriu de relance para mim e passou a língua pelos lábios. Eu desviei o rosto, temendo rir-me com a careta dele e ter de dar explicações.
Sentámo-nos no sofá ao mesmo tempo que o relógio da lareira, com um fauno perseguindo uma Flora em bronze, assinalava as 16.30.
Depois de ter conversado alguns minutos connosco, a tia Briolanja levantou-se e disse que ia ver se o chá já estava pronto. Referiu, desculpando-se, que teria de ir verificar pessoalmente se tudo estava a correr bem porque Emília não sabia medir quantidades, nem verificar a abertura das folhas.
Assim que saiu e fechou a porta, Eduardo começou a fazer-me cócegas.
Eu não consegui controlar o riso.
Tentei fugir das suas mãos, desequilibrei-me e caí.
Levantei-me e ele ajoelhou-se aos meus pés, pegou na faca do bolo e retirou com ela um pouco de creme.
Olhou para mim com os olhos brilhantes, em suspense.
Deixei-o levantar-me a saia, baixar as cuecas, barrar-me um pouco da nádega direita com o creme e lambê-lo. As suas mãos enterravam-se nas minhas coxas, o contacto da sua língua em carícias espiraladas era agradável e eu deixei-me bajoujar por ela perante o olhar de um velho vetusto de bigode retorcido pintado a óleo e pendurado na parede.
Gostaria de ter sido penetrada naquela altura, mas tivemos de parar porque começámos a ouvir passos no corredor. O soalho de madeira com caixa de ar em baixo permitia dar conta de todas as aproximações, por mais subtis que fossem.
Ele sentou-se repentinamente para disfarçar a erecção que despontava das calças e eu fingi ver o relógio da Flora e do fauno, com os braços cruzados para disfarçar, simultaneamente, a minha perturbação e os mamilos rijos que despontavam como se fossem de pedra (nesse dia eu não trazia sutiã e o vestido era implacável na modelagem das formas).
Felizmente a tia Briolanja não reparou (ou pelo menos fingiu não ter reparado) que o bolo tinha sido profanado. Emília serviu o chá, saiu e seguiu-se a tradicional conversa entre pessoas de família sobre pais, irmãos, estudos. Depois vieram as recordações e, a propósito de qualquer episódio da infância de Eduardo, a tia lembrou-se que tinha no quarto alguns álbuns com fotografias que gostaria de lhe mostrar e insistiu em ir buscá-los.
Seguiu-se uma nova ausência.
Eduardo abriu as pernas com um sorriso obsceno e as suas calças mostravam que a erecção ainda não tinha passado. Estendi a minha mão e acariciei-lhe a protuberância.
Num ímpeto ele meteu as mãos entre as minhas pernas e finalmente, olhando-nos mutuamente olhos nos olhos, consegui libertar o orgasmo que ficara em suspenso uns momentos antes.
Ele abriu o fecho, retirou o pénis e roçou-o pela minha perna nua.
Eu peguei num pastel de nata e mergulhei-o na sua ponta, rodando-o várias vezes até espalhar bem o creme. Depois lambi-o e chupei-o lentamente. Eduardo fechou os olhos e soltava pequenos gemidos à medida que a excitação ia aumentando. Quando ele estava quase a vir-se, ouvimos novamente os passos que se aproximavam. Atabalhoadamente, ele escondeu o pénis debaixo do pullover de gola em bico aos losangos, os olhos nublados pela excitação não satisfeita.
A tia Briolanja entrou com dois álbuns enormes e pediu ajuda a Eduardo para a ajudar a pô-los na mesa.
Eduardo ficou em pânico e eu segredei-lhe:
- Levanta-te Eduardo, vai ajudar a tiazinha a pôr os álbuns na mesa…
Ele olhou para mim com um ar de mártir pronto a ser atirado aos leões (foi a única vez na vida que o vi vulnerável) e eu abafei uma gargalhada perante o cenário que se avizinhava: Eduardo, com um ar de beto que não parte um prato, a levantar-se com o pénis erecto escondido no pullover e a tia soltar um gritinho e exclamar:
- Ai Eduardinho, que tens? Estás doentinho?
No entanto, a minha alma benevolente falou mais alto e eu levantei-me a tempo de ajudar a velha senhora e, por acréscimo, salvar a honra de Eduardo. Enquanto isto se passava, Eduardo precipitou-se para a casa de banho e voltou depois mais calmo e a visita decorreu normalmente, sem mais percalços eróticos.
À saída, a tia perguntou-me se eu não apreciava pastéis de nata. Tinha-se apercebido da massa esvaziada no meu prato. Eu respondi-lhe que apreciava mais o recheio. Ela respondeu:
- Ai sim? Eu também!
E sorriu-me.
Foi assim que ficámos amigas a partir daí.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Tangas Lésbicas - Um convite à publicação

Já recebemos umas dezenas de contos para a edição 2010 dos Contos Tangas Lésbicas, mas como algumas já receberam tarde o anúncio do concurso, o prazo vai até fim de Maio, para dar tempo às interessadas.

Relembro que o livro de contos de 2009 vai ser lançado em Junho, no Porto, em Lisboa, na Galiza e no Rio de Janeiro.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Aconteceu num elevador

Quando ele entrou no elevador a sua ideia era ir beber um café ao centro comercial que existia no sopé da torre de escritórios onde trabalhava. A rapariga de cabelos curtos e olhos claros, saia muito curta, camisa semitransparente, longas pernas, lábios cheios, sandálias de salto alto e fino, entrou uns momentos antes das portas se fecharem e ele pensou “ quem será?” Trabalhará aqui, como eu? Pela falta de carteira deve trabalhar e vai... sei lá onde é que ela vai...muito eu gosto de especular.”
No 19º piso, uma família grande, gorda, numerosa e barulhenta, mas onde só havia mulheres e crianças, empurrou-os um de encontro ao outro.
Olharam-se e sorriram como que a pedir desculpa.
Mas a família numerosa e gorda mexe-se muito, fala muito. Zangam-se por causa de um menino gordo, que quer comida. A, talvez mãe, dá-lhe, ou prepara-se para lhe dar... qualquer coisa que a obriga a tentar abrir o saco que tem pendurado no ombro. A avó ralha-lhe e empurrara-a para a obrigar a fechar o saco. De gesto em gesto... empurrão em empurrão, acabam por os atirar, de novo, um contra o outro.
Agora pedem mesmo desculpa... e sorriem: Os dois corpos encostam-se. Ele sente-lhe o calor... há um seio que lhe atormenta o antebraço. A blusa dela é fina... Ele tem as mangas da camisa levemente arregaçadas. O seio é morno, tenso... Ela não tem soutien. Ele olha-a, com que a perguntar... Ela cora, diz qualquer coisa, que a família gorda, grande e ruidosa não deixa ouvir, mas o calor da pele dela afaga-o.
Mais uns gritos da família grande, gorda e barulhenta, mais uns empurrões. O calor no elevador aumenta, a família grande, gorda e barulhenta parece aumentar também. Há uma menina pequena, gorda e barulhenta, de trancinhas que chora, porque um menino gordo de sorriso alarve lhas puxa com força.
Ao fundo, ao canto, eles encostam-se mais... talvez para fugir à família grande, gorda, barulhenta e numerosa, ou talvez não. Olham-se... Ele sente a respiração dela afagar-lhe o pescoço, que a camisa aberta deixa destapado... O menino gordo puxa mais...as tranças da menina gorda que chora. Ela fita-lhe os lábios e aproxima-se mais, sente-lhe o calor... A respiração torna-se mais rápida. A menina das trancinhas grita mais... A mão dela pousa suave no peito dele, entreabre os lábios, mostra uma língua rosada que acaricia os dentes, brancos e certos... Ele tem um arrepio... sem saber como roçam-se... voluntariamente. A família grande, gorda, barulhenta e numerosa, só com mulheres e crianças agita-se, parece crescer, empurra-os... a mão dele caminha por debaixo da saia dela e encontra as cuecas molhadas. Rápido, afasta-as, e os seus dedos tocam-lhe o sexo... Ela encolhe-se mas os seus olhos velam-se entregando-se ao prazer daquele toque... e a mão procura o corpo dele... e a família grande, gorda e numerosa ameaça o menino do riso alarve, gritando aquela que parece ser a avó “larga já as tranças da Céuzinha ou levas uma carga de porrada quando chegarmos lá fora” E o menino alarve ri e puxa mais... E a menina das trancinhas grita mais. E a mão dela encontra o volume duro que parece palpitar dentro das calças dele... E os dedos dele martirizam-lhe, docemente, o sexo... E ela respira mais fundo... E ele fecha os olhos... e esquecem o elevador que acaba de parar. E esquecem a menina das tranças que chora, e o menino do riso alarve que já não ri porque a mão da mãe... ou de uma qualquer tia, prima, ou lá o que seja lhe assentou um pesado bofetão que lhe apagou o sorriso... e a porta do elevador não abre... e ela mexe-se e ele mexe-se... e o orgasmo apanha-os de surpresa... e gritam. Um grito de prazer, de libertação... um espasmo... um odor que enche o ar, da cabina do elevador... sobreaquecido.
Cai um silêncio... a família grande, gorda, barulhenta e numerosa pára! Olha...No pequeno espaço do elevador abre-se uma clareira, onde eles são centro, agarrados um ao outro, com as mãos em sítios proibidos... E sentem o olhar, primeiro interrogativo, depois acusador, condenatório finalmente, da família grande, gorda, barulhenta e numerosa quando as mulheres perceberam, ou pensaram ter percebido, o que se passara.
E foi a menina das trancinhas quem alertou para o sucedido:
-Eles fizeram “xi-xi” – e o dedinho insuportavelmente gordo a apontar para os dois, ou melhor para a mancha escura nas calças dele e para as coxas dela que, a saia curta deixava bem visíveis, onde um liquido brilhante escorria para o chão.
E a família grande, gorda, barulhenta e numerosa onde só havia mulheres e crianças, agora silenciosa, recuperou a sua índole barulhenta e num tropel desordenado saiu do elevador.
-Porcalhões – atirou a avó – há aqui crianças!
-Cabra, depravada, porca! – Gritou a mãe da menina das trancinhas
- Vaca! – Lhe chamou a que parecia ser mãe do menino de riso alarve que já se perdia na entrada do centro comercial.
Ao fundo do elevador, agora vazio, eles viram as portas fecharem-se e olharam-se sem saberem o que dizer... ou fazer... mas nas suas faces havia um misto de espanto e satisfação, que nem um nem outro conseguiriam alguma vez explicar nos anos de vida que lhes restavam e que seriam muitos.

Lisboa 13 de Abril de 2010
JAVS

quinta-feira, 25 de março de 2010

Andamos a escrever mais sobre sexo, mas será que temos jeito?

Luís Francisco
10.02.2010

Os brasileiros são melhores do que nós, os poetas superam os romancistas. Será por causa das limitações da língua, falta-nos tradição literária ou somos demasiado pudicos? Os diagnósticos variam, mas os sintomas são comuns: em Portugal, (ainda) escrevemos pouco sobre sexo e nem sempre sai grande coisa
Não é fácil encontrar na literatura portuguesa bons nacos de prosa ou passagens poéticas com conteúdo sexual. Que o diga António Mega Ferreira, que em 2005 publicou uma antologia do "Erotismo na Ficção Portuguesa do Século XX". Pesquisou exaustivamente décadas de produção literária e o trabalho revelou-se "muito difícil", por falta de matéria-prima. Em quantidade e, sobretudo, em qualidade. Será que não temos mesmo jeito para verter em romance essas coisas do corpo?
O hoje presidente da Fundação do Centro Cultural de Belém não deixa margem para segundas leituras: "Encontrei coisas horrendas ao longo da pesquisa." A escritora Lídia Jorge também não tem dúvidas: "Somos bons noutras coisas, nessa não." Mais contundente, o jornalista e escritor Miguel Sousa Tavares assume que, em Portugal, "escreve-se muito mal sobre sexo". Já o crítico Pedro Mexia acha que o problema não é só português, está "em todo o lado", devido à "dificuldade do tema".
Mas se Mega Ferreira tivesse alargado o seu horizonte à literatura de língua portuguesa, o resultado poderia ser bem diferente. Autores como João Ubaldo Ribeiro e Rubem Fonseca, ambos do Brasil, aparecem com frequência quando se pedem bons exemplos de literatura com conteúdo sexual, erótico. O escritor angolano José Eduardo Agualusa menciona ainda o seu compatriota Ruy Duarte de Carvalho. Será que as palavras do português de cá não ajudam?
"'Bunda' é muito melhor do que 'rabo'. 'Seios' é piroso, 'mamas' é cru. 'Pau', no Brasil, resulta e por cá vai-se generalizando. Mas a palavra começada por 'c' nem poderia aparecer neste artigo..." Inês Pedrosa, escritora e directora da Casa Fernando Pessoa, regista uma série de dificuldades com o léxico. "A nossa língua anda muitas vezes por dois extremos: o lírico e o obsceno, grosseiro. Às vezes faltam as palavras", completa Lídia Jorge
Será, então, um problema da língua? "Não. Se fôssemos realmente bons conseguíamos sê-lo com a nossa língua", sentencia Mega Ferreira. Miguel Sousa Tavares concorda: "Tem a ver com a capacidade dos escritores; o português do Brasil é melhor, mas não é só isso..." Pois, conclui, José Eduardo Agualusa, "os escritores brasileiros, de uma forma geral, são muito melhores do que os portugueses quando se trata de escrever sobre sexo".
Mas Portugal tem e teve bons escritores. Haverá alguma razão para que o sexo apareça tão pouco e de forma tantas vezes desastrada ao longo de décadas de produção literária? Bom, não será apenas uma. Há um conjunto de razões, a começar pelo facto básico de que "o sexo é diferente a Sul do Equador", como constata Mega Ferreira, que fala de "um pudor enormíssimo" entre nós.
A falta de naturalidade aparece, assim, como o pecado maior das nossas letras nesse campo. "A literatura portuguesa está cheia de pudor, falsamente vitoriano", analisa o escritor Baptista-Bastos. "A tradição do neorealismo foi desastrosa, com um estilo absolutamente piroso a tratar de sexo, e as gerações seguintes ficaram marcadas", aponta Miguel Sousa Tavares. Talvez isso explique o recurso maciço a metáforas sempre que o sexo entra em cena. Que traz consigo outro problema: "Algumas metáforas são assustadoras", avisa Pedro Mexia.
Inês Pedrosa acha que elas não fazem falta nenhuma. "O sexo tem uma força em si que dispensa a metaforização. Esta é usada para esconder as palavras. Mas pele é pele, corpo é corpo...", diz a escritora. Mas também isto não é uma lei absoluta: "Hoje em dia, na crítica, parece que a metáfora está 'out'; tudo o que não pareça muito cerebral parece que já não merece ser literatura."
A força da poesia
Apesar de tudo, evitar tratar as coisas pelos nomes pode não ser um golpe de morte na intenção de criar uma atmosfera de tensão carnal. Nem sempre a linguagem mais explícita teve a aceitação pública que hoje vai tendo e os escritores foram encontrando caminhos que não passassem pela camuflagem metafórica. Às vezes, como lembra Baptista-Bastos, há que oferecer ao leitor uma "ampla margem dedutiva". Leia-se "O Primo Basílio", de Eça de Queirós, romance em que Mega Ferreira situa a "primeira inscrição do erotismo na literatura portuguesa":
"Basílio achava-a irresistível; quem diria que uma burguesinha podia ter tanto chique, tanta queda? Ajoelhou-se, tomou-lhe os pezinhos entre as mãos, beijou-lhos; depois, dizendo muito mal das ligas 'tão feias, com fechos de metal', beijou-lhe respeitosamente os joelhos; e então fez-lhe baixinho um pedido. Ela corou, sorriu, dizia: 'não! não!" E quando saiu do seu delírio tapou o rosto com as mãos, toda escarlate; murmurou repreensivamente:
- Oh, Basílio!
Ele torcia o bigode, muito satisfeito. Ensinara-lhe uma sensação nova; tinha-a na mão!"
Sexo oral no século XIX?! Foi por estas e por outras que o próprio pai de Eça, apesar de conquistado pela força da narrativa, lhe puxou as orelhas. A descrição de cenas eróticas sempre chocou algumas consciências. E é por isso que os poetas, com a sua abordagem teoricamente mais desligada da realidade, beneficiam de um maior à-vontade. O que eles dizem não é bem o mundo, é poesia, pensará o cidadão comum.
Será essa a explicação para a larga vantagem que a poesia leva sobre a prosa nesta área do erotismo? Não, diz Miguel Esteves Cardoso. O escritor e colunista considera que "os melhores escritores sobre sexo tendem a ser os melhores escritores". No caso português, os melhores são poetas. "Camões e, mais recentemente, Vitorino Nemésio, Mário Cesariny, Herberto Hélder, João Miguel Fernandes Jorge e Joaquim Manuel Magalhães." Conclusão, para que não restem dúvidas: "Na prosa somos um desastre."
Será, talvez, porque os portugueses "têm mais jeito para expressar a frustração do que o desejo", na visão do escritor Rui Zink. Também para ele, os poetas levam a melhor. "Para expressar o desejo e o corpo, escolhemos a poesia. Assim, de cor, penso em [António] Botto, Florbela [Espanca], Natália [Correia], Eugénio [de Andrade], [Maria] Teresa Horta, Al Berto, [Alberto] Pimenta... Já na prosa somos furtivos, tímidos ou, então, temos actos falhados."
Pode haver várias tentativas de explicação para esta inabilidade literária, numa área que é, e será sempre, "um campo minado". Mega Ferreira fala da "tardia tradição do romance" entre nós, mas também dos "50 anos de ditadura salazarista", com a sua lógica de "censura e marginalização do tema sexual". Um véu pesado, também com uma componente religiosa muito forte, que deu origem a uma "cultura casta e lírica", analisa Lídia Jorge.
A "prova de fogo"
Todos os que escrevem têm consciência da realidade que os rodeia no que respeita aos espinhos do erotismo escrito. Uma consciência formal, que se prende com os gostos do público, o seu estilo pessoal ou a contundência da crítica. Mas também - porque dentro de um escritor há sempre uma pessoa - uma consciência pessoal. No momento de escrever sobre sexo, será que os escritores não pensam: "O que é que a minha mãe [ou o meu filho, ou...] vai pensar disto?" Será que, de algum modo, se autocensuram?
"Claro, como aliás acontece com qualquer cena relativamente 'inspirada na vida real'", assume o escritor Francisco José Viegas, apoiado por António Mega Ferreira, também ele com obra publicada: "Tenho consciência dos condicionalismos do passado e do presente e não sei se teria talento para evitar os alçapões." Já Miguel Sousa Tavares garante não ter "qualquer autocensura" - "A minha preocupação é não ser ridículo, não forçar." Tese, antítese... e síntese. Lídia Jorge: "Somos seres complexos, às vezes fazemos censuras de que não nos damos conta."
Inês Pedrosa, por seu turno, está-se "nas tintas" para o que as pessoas possam pensar. Considera "um desafio escrever sobre sexo" e o seu livro mais recente, "A Eternidade e o Desejo", termina exactamente com um orgasmo feminino. "Se é verdade que um romance caminha para o seu clímax, então é um final muito apropriado!", brinca. Mas recorda-se de receber "alguns conselhos pré-publicação para 'esconder' o orgasmo mais no meio do livro"... Ignorou-os e o seu próximo trabalho terá ainda mais cenas eróticas, porque a autora escolheu abordar o tema da amizade masculina. E, quando os homens se juntam, falam inevitavelmente de sexo.
O mesmo parece acontecer aos escritores quando enfrentam a folha em branco. Lídia Jorge: "Escrever é fazer amor com o mundo. Há uma pulsão erótica na escrita, como em qualquer arte. Escreve-se sobre o destino. E o amor tem uma farta fatia do destino. E o sexo tem uma farta fatia do amor." E é por isso que os escritores arriscam constantemente enfrentar essa "prova de fogo" do erotismo. Mesmo que muitos acabem por se queimar.
Pedro Mexia acha que é, "como no cinema, das coisas mais difíceis de fazer" e salienta que na literatura "há sempre dois extremos, ambos perigosos: o obsceno e o kitsch". A ter de escolher, coisa que sucede muito frequentemente quando se lê sobre sexo, ele prefere o primeiro. Mas há, entre os autores, quem evite "andar nessa corda bamba entre o obsceno e o kitsch".
António Lobo Antunes, por exemplo, já confessou a sua falta de jeito para as cenas eróticas e não se mete nisso. Outros - e génios! - antes dele fizeram o mesmo. "O [Alfred] Hitchcok dizia que não podia filmar uma cena de sexo por causa dos planos de corte, que falseiam a realidade. Só em plano-sequência...", lembra Mexia.
"Vigilância acrescida"
Será pelo desafio da escrita ou pela incontornabilidade do tema quando falamos da existência humana, a verdade é que o sexo acaba quase sempre por irromper numa história. E, quando isso acontece, o que faz o escritor? "É preciso atenção, mas a abordagem tem de ser natural e sem abdicar do estilo próprio e do tom da obra", avisa Miguel Sousa Tavares.
É por isso que Lídia Jorge não procura "escrever cenas demasiado expostas, exibicionistas" - "A nossa cultura não o faz e eu não o faço. É cultural e é, também, pessoal." Regra máxima: "A sugestão é mais importante do que a exibição. A Agustina [Bessa-Luís] até costumava dizer que quem precisa mais de exibição são os impotentes."
Francisco José Viegas bate mais forte. "O que me irrita mais é quando um autor, sobretudo quando escreve na primeira pessoa, tem de falar do imenso, forte, brutal, devastador, grosso pénis erecto. É uma mania exibicionista e, já agora, 'brochante' na maior parte das vezes, porque, vê-se logo, quem faz pouco sexo, escreve sobre o assunto."
Também ele prefere a sugestão à exibição. "As cenas de sexo, ou os diálogos sobre sexo, correm muito mais o risco de desaguar no puro mau gosto. Acho que prefiro sugerir, abrir um pouco o jogo, mas deixar a coisa suspensa. Ou então ser decididamente 'brutal'." Quando tem de ser, tem de ser. Lídia Jorge recorda uma personagem do seu romance "O Vento Assobiando nas Ruas", uma rapariga "um pouco 'atrasada', que não sabe autocontrolar-se e, por isso, conta com toda a clareza a expressão do seu desejo". Não teve reacções negativas.
Também não há forma de prever ao milímetro o que as pessoas vão pensar. Francisco José Viegas lembra-se de uma crítica em que se falava de um "erro fatal" no romance "Longe de Manaus" - o escritor tinha 'assassinado' uma personagem feminina "exactamente quando ela se preparava para uma cena de sexo com outra mulher"... Na verdade, comenta Inês Pedrosa, "temos tendência para pensar que o país é mais conservador do que realmente é".
"Nunca é um exercício fácil, correm-se múltiplos riscos e, muitas vezes, ser politicamente correcto atrapalha as coisas", regista Patrícia Reis. A escritora e jornalista salienta ainda outra variável nesta equação a múltiplas incógnitas: "O sexo é entendido de forma diferenciada. Somos leitores diferentes ao longo da vida, do mês, da semana. O que hoje nos choca, amanhã pode ser indiferente. E o sexo é valorizado e desvalorizado numa vertigem doida desde que as novas tecnologias o banalizaram."
Usando assumidamente um eufemismo - "Não lhe chamaria autocensura, antes vigilância acrescida" -, Mega Ferreira explica que o escritor "corre sempre o risco de, ao dar destaque a uma determinada cena, esta ficar presa no seu conteúdo erótico, apenas uma cena, sem mais do que ela própria". Ou seja, de não contribuir em nada para o fluir da história. Um problema para o qual Francisco José Viegas diz ter uma solução: "O ideal é deixar as personagens a foder, lá dentro, no quarto, e nós falarmos de outra coisa enquanto eles fazem a coisa como deve ser."
Maus exemplos
O problema é quando entramos por ali adentro e a coisa não corre mesmo nada bem. Veja-se este naco de prosa de "O Codex 632", um dos vários "best-sellers" de José Rodrigues dos Santos:
"Parou de comer e fitou-o com uma expressão insinuante. 'Sabe qual é a minha maior fantasia de cozinheira?'
'Hã?'
'Quando um dia for casada e tiver um filho, vou fazer uma sopa de peixe com o leite das minhas mamas.'
Tomás quase se engasgou com a sopa.
'Como?'
'Quero fazer uma sopa de peixe com o leite as minhas mamas', repetiu ela, como se dissesse a coisa mais natural do mundo. Colocou a mão no seio esquerdo e espremeu-o de modo tal que o mamilo espreitou pela borda do decote. 'Gostava de provar?'
Tomás sentiu uma erecção gigantesca a formar-se-lhe nas calças. Incapaz de proferir uma palavra e com a garganta subitamente seca, fez que sim com a cabeça. Lena tirou todo o seio esquerdo para fora do decote de seda azul (...). A sueca ergueu-se e aproximou-se do professor; em pé, ao lado ele, encostou-lhe o seio à boca. Tomás não resistiu. Abraçou-a pela cintura e começou a chupar-lhe o mamilo saliente."
Há gostos para tudo, mas esta é uma das cenas mais vezes lembrada quando se fala em maus exemplos de sexo na literatura portuguesa. Uma quase unanimidade que o autor não comentará neste artigo, por se ter escusado a prestar declarações.
Resta-lhe a consolação de aparecer em boa companhia quando se pedem exemplos de passagens eróticas particularmente más. Pedro Mexia começa por se lembrar do "leite de mamas", mas como, no seu entender, "isso nem é bem literatura", avança para algumas passagens "de extremo mau gosto" escritas pelo Nobel José Saramago.
Nem todos são cruéis "ao ponto de dizer nomes", como confessa Rui Zink, que se limita a constatar que "a cabeça dos homens portugueses é pouco fluida quando chega às coisas do corpo". Por pudor ou memória selectiva, José Eduardo Agualusa também fala no geral: "Há escritores excelentes que produziram frases más sobre sexo, mas graças a Deus não me recordo de nenhuma."
Já Patrícia Reis lembra um livro "cujo título é maravilhoso e verdadeiro: 'O Amor é Fodido', de Miguel Esteves Cardoso". Mas... "O conteúdo, as cenas mais concretas de sexo, a linguagem gratuitamente pornográfica não me adiantou nada." De um livro inteiro para uma passagem específica, eleita pelo crítico Eduardo Pitta:
"Dois soldados, em vez de enterrarem os cadáveres dos seus amigos mortos em batalha, escaparam às ordens, e num pequeno bar, ainda com o uniforme manchado, mandam vir uma mulher - uma prostituta - e os dois sobem com ela para um quarto e fornicam-na. Um colando-lhe o pénis na boca e o outro fornicando-a por trás como fazem os cães às cadelas e os homens às mulheres ou a outros homens."
O livro é "Água, Cão, Cavalo, Cabeça", o autor Gonçalo M. Tavares. "Se houvesse um prémio em Portugal [para más passagens eróticas], haveria alguns bons concorrentes", avalia Mega ferreira. "Incluindo pérolas de grandes escritores. Como já dizia o outro: 'Homero também dormita'..."
A questão não é académica. No Reino Unido há mesmo um prémio anual para Mau Sexo em Literatura, este ano conquistado por Jonathan Littell, com o romance "As Benevolentes". Vendeu mais de um milhão de exemplares por essa Europa fora e o júri destaca a genialidade da obra. Bom, pelo menos da maior parte: "Passagens como 'Vim-me subitamente, um jorro que me esvaziou a cabeça como uma colher raspando o interior de um ovo pouco cozido [tradução livre]' garantiram o prémio a 'As Benevolentes'", anunciou a "Literary Review", promotora de uma iniciativa que este ano tinha na lista de finalistas nomes tão consagrados como os de Paul Theroux, Nick Cave, Philip Roth ou Amos Oz. Entre outros.
O fogo de Jorge de Sena
Mas deixemo-nos de negativismos. Fechada a cortina sobre as más cenas de sexo, o que haverá a destacar no extremo oposto? Onde estão os bons exemplos? As respostas surgem agora mais soltas e abundantes - talvez que, por serem raros, acabem por gerar maior unanimidade.
Miguel Sousa Tavares fala de "Sinais de Fogo", de Jorge de Sena, romance também citado por Mega Ferreira, que o considera uma "obra invulgar", onde a "instância sexual só não está do princípio ao fim porque se trata de uma obra inacabada..." Patrícia Reis chama-lhe "um livro poderoso". Rui Zink também escolhe Jorge de Sena, mas prefere "O Físico Prodigioso".
José Eduardo Agualusa lembra vários romances de Rubem Fonseca e destaca ainda "O Sorriso do Lagarto", de João Ubaldo Ribeiro; "Rakushisha", de Adriana Lisboa; e "Os Papéis do Inglês", de Ruy Duarte de Carvalho. O primeiro merece igualmente a preferência de Pedro Mexia e Francisco José Viegas. Diz este: "O livro de língua portuguesa onde há melhores cenas de sexo é 'A Grande Arte', de Rubem Fonseca. Ele é muito bom a escrever essas cenas porque, justamente, não quer escrever 'cenas de sexo'. Quer falar de homens e mulheres."
Mas Viegas guarda ainda espaço para Mónica Marques e a sua "Transa Atlântica", com uma cena de 'ménage à trois' que é "de uma elegância festiva, feliz e deliciosa". Eduardo Pitta vai ainda mais longe no elogio. Para o crítico, a melhor cena de conteúdo sexual da literatura de língua portuguesa é... "Todas as de 'Transa Atlântica'. Overdose absoluta, sem metáfora. Pau e xoxota mesmo. Um clássico do género." E a seguir destaca Al Berto, por "Lunário", a "primeira narrativa portuguesa 'gender fucker'".
Outras referências: Maria Isabel Moura (Rui Zink); Inês Pedrosa (Patrícia Reis); Francisco José Viegas (Pedro Mexia); Carlos de Oliveira, em "Uma Abelha na Chuva" ("um primor de sugestão erótico-sexual, na sequência em que D. Maria dos Prazeres viaja na charrette, sente-se atraída pelo cocheiro", diz Baptista-Bastos); Miguel Esteves Cardoso (Mega Ferreira); Almeida Faria (Francisco José Viegas).
E ainda José Cardoso Pires. Em "A Balada da Praia dos Cães", Francisco José Viegas aprecia a safadice e Rui Zink elege mesmo como melhor cena da literatura portuguesa de conteúdo erótico "a masturbação revoltada do inspector Elias". É assim:
"Elias masturba-se. Sempre de olhar parado, vendo para dentro e a desfocar-se (o olhar de quem se deixa ir de viagem) enquanto a mão, o rosto e a boca dela o trabalham lá em baixo, e tudo se concentra. Elias vai num espaço fechado, numa caixa de espelhos, a cabeça solta, desligada dele. O pénis recurvo não pára de ser percorrido por uma cadência saboreada e insistente, e ele de olhar imóvel, diante dum vidro (que já não é de espelho, mas transparente) diante dum pára-brisas, um autocolante, um espelho retrovisor, para baixo e para cima, as molas do assento a rangerem num movimento mecânico e igual. Sempre."
A vez delas
Se há algo que nos surpreenda nestas escolhas, talvez seja a presença marcante de mulheres autoras. O que permite levantar a eterna questão de haver, ou não, uma escrita feminina, por oposição ao estilo dos homens, tradicional, de tratar as coisas do sexo. Apesar de Inês Pedrosa não querer que lhe falem "disso" da escrita feminina e masculina, tem mesmo de ser...
Francisco José Viegas: "Elas são melhores do que os homens e estão a escrever mais sobre sexo - não sei se isso é bom ou mau -, mais e mais despudoradamente, com mais imaginação e até com mais melancolia." Mega Ferreira: "As mulheres, porventura, ultrapassam melhor o pudor quase ancestral que nos tolhe; talvez tenham maior capacidade para escrever com mais à-vontade - talvez porque nomear o sexo, escrever sobre sexo, seja uma forma de emancipação."
Lídia Jorge não vê a coisa assim, até porque acha que "o esforço de transgressão" foi feito pela "geração anterior" à sua. E, já agora, também não aceita que se pense no sexo como "capacidade de expressão de uma literatura": "É uma prova de fogo um escritor ser capaz de entrar na intimidade sexual e ser capaz de a descrever com eficácia e elegância. Mas não é a medida para avaliar uma literatura."
Seja como for, não é mais difícil para uma mulher expor-se dessa maneira do que para um homem? Analisa Inês Pedrosa: "As mulheres são muito penalizadas quando escrevem sobre sexo. Há um discurso libertário, mas a verdade é que continua a impor-se aquele estereótipo de que um homem com muitas relações sexuais é um garanhão e uma mulher tem de ser recatada, se se atreve a escrever sobre isso é porque é uma devassa. As mulheres pensam em afectos e não têm corpo..."
Mas têm. E estão a falar cada vez mais dele. Neste como noutros campos, talvez elas sejam a nossa maior esperança.

O Erotismo em português é piroso e risível

Por Isabel Lucas
4 Janeiro 2008

Das razões de pouco se escrever sobre sexo em português
"Às vezes, em roda de amigos, citamos uma série de passagens do romance contemporâneo sobre sexo. Geralmente são citações pirosas, kitsch, muito risíveis. Não sei se se pode daí depreender que os escritores portugueses não têm intimidade com o sexo; mas a generalidade das descrições são muito pirosas." Francisco José Viegas, jornalista, escritor, autor de romances como Longe de Manaus ou Lourenço Marques (Asa), tenta encontrar explicação para o que o crítico literário Pedro Mexia considerou ser, numa crónica antiga, "um trauma da ficção portuguesa": a maneira como por aqui se fala ou escreve sobre sexo. "É foleira", disse.
E disse-o a propósito de um dos excertos mais comentados nas páginas literárias, na blogosfera, mas, sobretudo, nas tais rodas de amigos a que se refere Viegas. O romance em causa é Codex 643 (Gradiva), de José Rodrigues dos Santos, e a passagem, a que se segue: "Quando um dia for casada e tiver um filho, vou fazer sopa de peixe com o leite das minhas mamas." A frase dita por uma estudante sueca do programa Erasmus dirige-se a Tomás, um professor catedrático de 35 anos. Não há um palavrão, mas o indício de todo o ambiente: "Uma erecção gigantesca a formar-se nas calças de Tomás. (...) Lena tirou todo o seu seio esquerdo para fora do decote de seda azul (...) Aproximou-se do professor; em pé, ao lado dele, encostou-lhe o seio à boca. Tomás não resistiu. Abraçou-a pela cintura e começou a chupar-lhe o mamilo saliente."
Numa antologia sobre o tema O Erotismo na Ficção Portuguesa do Século XX, (Texto Editora) António Mega Ferreira chama a atenção, no prefácio, para a escassez de obras de cariz erótico fora da poesia, uma "espécie de rasura do erotismo na prosa narrativa". Isso leva a que Frederico Lourenço sempre que escreve sobre sexo se refugie na "conceptualização".
Motivos? Apontam-se alguns. Francisco José Viegas, como Frederico Lourenço, vai ao vocabulário. "Talvez o problema seja da linguagem à matéria sexual. O nosso vocabulário de sexo é muito pobretanas; não temos a malícia brasileira, evidentemente, onde 'pau'; é 'pau' e não 'pénis', 'pixota', 'pila' e outras coisas que transformam qualquer cena de sexo num fragmento de pornochanchada alemã." Ou, como prefere Lourenço, é fácil cair na pornografia, na obscenidade". Por isso, declara a sua incapacidade de escrever sobre o assunto. "Não consigo."
Encontrar a palavra. Essa a grande dificuldade segundo Miguel Sousa Tavares, autor do romance Equador e do recente O Rio das Flores. "O problema não é o conteúdo. É o mesmo que escrever sobre uma casa, uma paisagem. Escrevo sobre o que existe. O sexo existe e escrevo sobre ele. A dificuldade é não cair no mau gosto e aí a língua portuguesa não facilita. Como se descreve, por exemplo, o peito de uma mulher? O idioma é muito rico em muitos aspectos, mas não no sexual. Ou temos o palavrão ou a palavra pirosa." Como salienta Francisco José Viegas, "todos temos uma lista de frases assassinas para recordar. Às vezes são, até, descuidos nossos".
Descuido dos escritores, sublinhe-se. Vasco Graça Moura chama a atenção para o risco de se cair facilmente na pornografia. "Pornográfico é o erótico visto de muito perto", refere o escritor. José Rodrigues dos Santos, autor do trecho atrás transcrito, tem menos pudores e confessa que não se sente limitado pelo vocabulário. "Em arte não há regras. O que uns acham horrível, outros acham belo", declara o autor do recente O Sétimo Selo (Gradiva). Para ele não existem "dificuldades especiais além das inerentes à escrita ficcional. Tudo é possível, desde o verosímil ao inverosímil", " até o ultrajante"...
Faltarão mulheres a escrever sobre o assunto, como sugeres Viegas? "Talvez a linguagem evoluísse, se se libertasse, ou melhorasse bastante. Desde que escrevessem sobre sexo e não sobre fisiologia ou males da alma. O romance português vive ainda uma fase pedagógica e didáctica, onde cada cena de sexo é acompanhada de uma teoria, chamando a atenção para a raridade dos orgasmos ou para a delicadeza da situação. Se me perguntassem directamente, sim, diria que se fode mal na literatura portuguesa."
Margarida Rebelo Pinto confessa o gosto por estas passagens. "Escrever sobre erotismo mexe com as vísceras, com o que temos de mais básico." Não se vê a cair no mau gosto. "Pinto o mundo de cores suaves e, mesmo quando sou crua, não tenho medo das palavras nem de cair em coisas vulgares porque acho que não vou lá parar. Mas não travo nada."

Escritores eróticos procuram-se

por Diana Garrido, Publicado
em 09 de Dezembro de 2009

Há literatura erótica em Portugal? Quem a escreve? Falámos com autores, editores e escolhemos algumas passagens dos poucos livros que existem
"Que puta de tesão o homem me dava! [...] Imagina a sensação de estar só, de repente, tudo! Tudo surge limpo e claro e terno e nu [...] Desejo que me matava, voava e morria ao mesmo tempo, morria e voava."Vera Galpe, um pseudónimo "tirado de uma lista escrita por amigos" demorou um ano a escrever "Vírgula, Caralho" e dois a corrigi-lo. A obra "nasceu da vontade de escrever sobre desejo e sexo". "Tinha acabado de ler 'As Onze Mil Vergas' de Apollinaire, fez-me rir de tanto horror. Eu não queria horror. Estava apaixonada. E decidi escrever a minha versão do mundo entre as pessoas." O livro, editado em 2007 pela Asa, de capa rosa-choque, não desvenda a identidade por trás das palavras sem pudor, às vezes agressivas e quase sempre cruas. Para Vera "o sexo é o corpo cheio de vida, o amor a querer passar, é o poder de rasgar". Escreve porque precisa e diz que quando o faz se sente "quase feliz". Os textos saem-lhe da imaginação, que alimenta com vários autores estrangeiros, já que em Portugal há poucos escritores do género. Segundo Vera Galpe, isso tem a ver com as limitações do país: "O preconceito existe e não me parece que vá desaparecer. Os homens e as mulheres desta terra são silenciosos. Nesta terra fode-se às escuras."Os especialistas
Para Francisco Lyon de Castro, da editora Europa-América, a pouca quantidade de obras eróticas de autores portugueses está relacionada, também, com o mercado: "É muito pequeno. Por outro lado, as cadeias de hipermercados e vários livreiros não apostam neste tipo de literatura, por uma questão de pudor, de censura, classificando as obras, várias vezes, como livros pornográficos."Carlos da Veiga Ferreira, editor da Teorema, também acha que a questão se prende com "o pudor e o preconceito que ainda existe. Em segundo lugar a escrita erótica é muito difícil, já que a fronteira entre o erotismo e a pornografia é muito ténue." Para Carlos, essa fronteira é feita "através da qualidade literária. Não são os temas nem a linguagem, é a qualidade da escrita". A Teorema, que publicou uma colecção erótica intitulada Canto Nono, tem, no entanto, poucos livros editados e apenas um de autoria portuguesa: "O nosso objectivo era apresentar literatura erótica de qualidade e isso é muito difícil conseguir." Carlos acredita que haverá muita literatura deste género na gaveta, mas nas obras mais recentes a linha erótica é pouco explorada. "Parece haver uma espécie de pudor em abordar esse tipo de temas." Joana Almeida é psicóloga, sexóloga e formadora de workshops de escrita erótica na Escrever Escrever (www.escreverescrever.com). O objectivo é "libertar a vergonha, fazer com que se deixem levar pelas fantasias, brincar com os tabus".O facto de haver tão poucos autores dedicados a este género pode "ser reflexo de uma cultura com muitos tabus e pouco desinibida". Quanto à dificuldade da escrita deste género, há certas questões a ter em conta: "Muito erotismo pode ser considerado pornografia para algumas pessoas. O que é excitante para uns pode ser ofensivo para outros. Na minha opinião é positivo que o erotismo não tenha uma linha clara e definida como, por exemplo, os filmes pornográficos têm. Explorar fantasias e fetiches pode ser saudável."As mulheres no erotismo "Então, pela primeira vez, masturbei-me à luz do dia, com o sol a entrar a rodos pelos vidros martelados da casa de banho. Toda nua e molhada, encharcando o chão e sem me ralar com isso [...] sentindo o sol e os olhos do mundo a baterem-me nas costas [...]" A personagem de "Todo o Começo É Involuntário" é uma mulher cujos desejos foram sempre estrangulados por uma mãe controladora e puritana. A sua autora, Maria Isabel Moura, escreveu o livro "para testar as garras". "É um tema muito difícil e queria ver se conseguia manter-me na raia o mais possível. A fronteira entre o erotismo e a pornografia é muito ténue e está na escrita. Uma escrita sem qualidade e entra-se na pornografia. É uma questão estética."Segundo Carlos da Veiga Ferreira, a obra é "um romance erótico muito forte". O livro, que pertence à colecção Canto Nono, da Teorema, tem prefácio de Urbano Tavares Rodrigues, que considera a autora "uma contadora de histórias na linha de Sade, Henry Miller e Anaïs Nin". A comparação agrada-lhe: "Fiquei muito lisonjeada porque era o que pretendia. São três ícones do erotismo e ser comparada a esse nível é uma honra." Maria Isabel Moura, natural da Covilhã e colaboradora do "Jornal do Fundão", escolheu não se esconder atrás do anonimato nem de um pseudónimo: "Entrei no 25 de Abril já mulher e aprendi que temos de fazer as coisas pelos nossos próprios pés, temos de enfrentar as coisas de caras. Choques violentos são necessários em qualquer época. E eu queria ser confrontada, queria dar muitas explicações. Mas isso não aconteceu e não faço a mais pequena ideia porquê."Sexo Off the Record "Quando o querer é verdadeiro, amar e foder significam exactamente a mesma coisa." Para Paula Santiago, pseudónimo de uma jornalista de 37 anos, a fronteira entre erotismo e pornografia está "no sentimento e na escolha das palavras". O seu livro, "Sexo Off the Record", é uma obra autobiográfica que descreve as aventuras sexuais e sentimentais de uma estagiária com o seu editor, na redacção de um diário do Norte. A aventura começou no blogue "Palavras Quentes" em jeito de diário aberto a todos. Por outro lado, quis testar-se e perceber se seria capaz de "escrever textos eróticos sem descambar para a pornografia". "A maioria dos blogues que lia, ao fim de três linhas tornavam-se pornográficos, um bocado como os filmes. Eu quis escrever uma história suave, que não fizesse corar ninguém, que as pessoas não tivessem de se esconder para ler." Foi por isso que quando surgiu o convite da editora 7 Dias 6 Noites, a autora não hesitou. Quanto ao pseudónimo, pretende mantê-lo: revelar a verdadeira identidade não está nos seus planos, já que não sabe que consequências isso traria para a vida profissional e familiar. "Ainda há muito preconceito e muitos tabus."

terça-feira, 16 de março de 2010

Caetano (Exercício)


Uma mulher de pele escura atravessou-se à sua frente, exibindo um colorido turbante no cima da cabeça. Sentiu o seu aroma, levemente aromatizado a citrinos, e desejou possuí-la, ali mesmo, no largo do Chiado. Decerto que os transeuntes não se importariam de ver os seus corpos cantar o fado ao amanhecer.
Caetano andava sempre com o cabelo arranjadinho, as unhas castanhas do surro, o fecho das calças aberto e dele uma pila a apanhar ar fresco. Adorava vê-las passear e imaginar-lhes a cona. Camões não o recriminaria, era o seu fiel companheiro, estava ali para apoiá-lo nas horas do vinho. Além disso, a seu ver, todas eram esbeltas, fossem gordas, anafadas, magras, esqueléticas. Em todas era capaz de enfiar o seu besugo e desejava-o tanto, ansiava-o tanto... Mas coitado Caetano... morreu virgem.

terça-feira, 9 de março de 2010

O Abraço da Ursa Húngara


«A missa deve estar quase a começar», disse com a voz ainda oscilante. Pegou num lenço de renda preto, cobriu o cabelo e o pescoço e saiu de casa. De facto, o olhar terno e imaculado de Alenka parecia carregar consigo a ideia de um túmulo capaz de guardar os segredos mais íntimos. E ele sabia-o.
Ia tocar à campainha quando reparou que a porta estava entreaberta. «Estás aí? Posso entrar?», sussurrou. «Entra, estou no quarto», respondeu Alenka. Encontrou-a deitada no tapete de pêlo cinzelado, contorcendo o seu corpo franzino, como se o diabo tomasse as rédeas do seu corpo.
Gabor estava ainda de pé, com as calças caídas, quando Alenka lhe engoliu o tronco do pénis, simulando uma penetração comum. Lambia-o para cima e para baixo com a ponta da língua e beijava-lhe a cabeça de frade, imprimindo uma ligeira pressão com os dentes. Subitamente, Alenka abocanhou-lhe a bolsa do escroto, sugando os testículos alternadamente. As ondas eléctricas de prazer que se dispersavam, como faíscas, pelos pontos erógenos do corpo de Gabor incitaram-no a empurrar Alenka para trás e a sentar-se na borda da cama. Por pouco que não se veio. Chamou-a novamente, sem pronunciar uma palavra. Acima de tudo, desejava possui-la, aconchegá-la e assim Alenka poisou as bochechas do rabo no seu colo, sentindo finalmente o pénis duro como o tronco de uma árvore beijar-lhe os lábios e trepar-lhe a vulva. Enlaçou as pernas franzinas à sua cintura, chegando-se a ele o mais possível de forma a tornar a cópula mais intensa. O abraço era activo, suplicava posse, e ela provocava-o, movendo os quadris com brutidão. Os olhos de Alenka estavam fechados, dando asas à imaginação das mãos que acariciavam aquele corpo macio, «cheio de graça». Os seus sexos pareciam soluçar, deitavam lágrimas de prazer.
Os dois pareciam envoltos num duelo recíproco, ele puxando-lhe o cabelo âmbar que, como uma cortina, encobria as auréolas róseas dos seus seios, ela arranhando-lhe as costas largas e transpiradas. O tacto molhado das línguas e dos dentes parecia instigar um braço de ferro cada vez mais inquietante e os corpos fundiam-se numa espiral de sensações erógenas, rendidos à fluidez do outro, sentados no silêncio que ecoava pela casa. A temperatura subia e num impulso, o clímax estalou em infinitas pepitas de ouro.
Enquanto Alenka caminhava para a Igreja, começou a sentir o esperma escorrer-lhe lânguido pelas pernas. Dois miúdos que passavam com a mochila às costas cochicharam qualquer coisa ao ouvido e desataram-se a rir. «Será que tenho a saia molhada?», interrogou-se, atraiçoada pelo carmim das bochechas. Apesar do constrangimento, Alenka orgulhava-se daquela sensação de transgressão, de ousadia, de individualidade, sobretudo. No banco da frente, virada para o altar-mor, inclinou a cabeça e ajoelhou-se perante Deus.

quarta-feira, 3 de março de 2010

A primavera que entoou no seu regaço


O amante de segunda colou-se à página do livro e manchou as palavras de Dali, «do método que o ultrapassava então», quando Helena pulou da cama para dar um risco de coca à janela, em picos de pés, encarrapitando-se no parapeito ascendente da vida. Aspirava com o olhar o voo das aves marítimas e voava ao seu lado sem roupas e os globos oculares gotejavam tal era a pressão do ar; pusera-se nevoeiro e de repente perdeu-as de vista e caiu amortecida pelo peso do seu regaço, das suas coxas, dos seus braços, do seu ventre.
Pôs o livro de parte, provavelmente na gaveta da mesa-de-cabeceira, junto aos tampões amorfos para os ouvidos, e pensava como era bom lambuzar-lhe o comprimento, as veias, as protuberâncias laterais, com a mesma voracidade com que uma criança chupa um calipo num fim de tarde escaldante.
Helena estava deitada com uma serpente que além de lhe ter dilatado as pupilas, fê-la atirar a realidade para trás das costas e levantar voo, concentrando-se no mistério genital inflamado, nas pequenas gotas que se transformaram numa capa húmida. Brincava com a parte inferior do objecto fálico, andava à roda com ele, apressava-o ou então incentivava-o a passear pela púbis, arbúscula de pêlo. Os grandes lábios, reflectidos no espelho, adensavam e projectavam-se para fora, como a boca faminta de um peixe do rio; e a fenda delicada expandiu-se em flor, flexível à grossura do objecto vibrante.
Toda aquela agitação fez os pés da cama ranger, mas só ela pareceu não ouvir o ruído no momento em que a sua vagina sofreu uma contracção mais forte e se agarrou ao pénis falso, como fazem as raízes em terreno fértil. Desta vez, preferiu não proferir palavras ordinárias, não gemer, não gritar. Deixou que o prazer viesse ao seu encontro. Esticou-se na cama, com um dos joelhos dobrados e o braço esquerdo debaixo da almofada e, ao olhar-se ao espelho, viu a silhueta de uma mulher-estátua envolvida em pó de gesso.
O que mais lhe dava gozo depois de atingir um orgasmo era ver o corpo desintumescer, a sensação de alívio que dava o mote a longos monólogos interiores, nos quais se juntavam o pai, os irmãos e o avô numa zaragata tão grande que logo fugia para o deserto, enterrando os braços e as pernas na areia quente, tornando-se enfim uma miragem.
Apanhou o livro do chão e esticou um risco veloz na página manchada que citava: «Um dia, esvaziei completamente o interior de um bocado de pão, e que pensam que coloquei no seu interior? Um pequeno Buda de bronze, cuja superfície metálica enchi de pulgas mortas. Depois, fechei a abertura do pão com um pau, cimentei tudo... de modo a formar um todo homogéneo, como se fosse uma pequena urna, no cimo da qual escrevi: Compota de cavalo. O que significava isso?»

*Desenho de David Antunes

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Candy bar for Zézé Camarinha

Resplandecem as luzes
Afinam-se os paladares
Quando se vêem as “muses”
Excitam-se as glândulas testiculares

Lábios, olhos, corpos
Sexto sentido my ass
Linda como o caraças
Boa de mais para passar
Sem pôr as glandes a salivar

Lambem-se os lábios femininos
Agitam-se os pénis masculinos
As belas das “misses” desfilam
E os gajos até catrapilam

Catrapilam até ao tecto
Num desejo abjecto
Cuspido do cimo de um andaime
Pronto para cobrir o “macadaime”

Um gajo apruma a conversa
E lança-se convicto
Sem perceber que a Vanessa
Quer tudo, menos que lhe vão ao pito

Solta a barbárie “tugalesa”
Mas a “piquena” não entende a beleza
Recusa a gramática sedutora
Com uma desculpa redutora

Redutora do orgulho
Redutora do mangalho
Indutora à auto-estima
Que o importante é manter a cabeça para cima

Vai-se a gaja
Ficam-se os dotes
Um grande bem haja aos dedos
Que queremos continuar a meter nos potes!

In – corporate – Mente sana in corpus sanus

Tua mente , corpo meu
Cabeças unas pelo toque,
Guiadas pelo sentir que é teu
Gemidas pelo nosso choque.

Hostil takehover
Negócio de carne!
Gozar precoce,
Game over!

Há que foder,
Foder e gemer,
Dar o corpo ao manifesto,
Pinocar até ao excesso!

Explodir com a glande
Transar à grande
Foder, comer,
Sempre … até poder.

Sem regras, com regras,
in corpo, with vergas!
in mente, with vendas!
Doesn’t matter – in – corporate!

Senhor do Tempo


O Sol deixava escapar os seus últimos raios. Infligia as suas ultimas forças no vidro fosco em tons de laranja.
No salão ouvia-se em fundo o incomparável Miles Davis. Junto à varanda num ondulante mover de corpo estava ela. A sua sombra vagueava pelas portadas da varanda destacando-lhe cada contorno.
O deslizar da ancas interrompido pelo recorte pronunciado de um seio firme, hirto, retocado...
A écharpe tigrada pendia tocando-lhe a pele.
Era tudo o que tinha vestido.
A dança continuava .
As mão esguias tocavam a pele. As unhas longas como garras ameaçavam uma fome constante.
Os longos stilletos negros eram o início da viagem pelo seu corpo torneado. A pele como veludo ansiava o toque.
Um breve fechar de olhos e o toque surge, trazendo consigo uma tremura. Mas aquele toque pedia mais e, reafirmando a sua presença a mão subiu. Sentiu as nádegas testadas com um aperto másculo de desejo.
Encostou as mãos à portada e esperou...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Ainda não eram nove horas da manhã quando Joana tocou à campainha. Filipe ainda se estava a vestir mas correu para a porta apenas com o roupão vestido, excitado que estava com a ideia que aquele dia seria celebrado de maneira singular. Era a primeira vez que Joana o visitava em sua casa e, ao vê-la, deparou-se com o olhar penetrante dos seus olhos verdes que tinha conhecido há mais de dez anos, numa relação que perdurava no tempo graças à sensualidade que emanava daquele corpo alto e bonito.

Joana fechou a porta atrás de si com o pé e deixou cair a mala no chão ao mesmo tempo que se lançava nos seus braços, beijando-o. Nestes momentos, nem sequer murmuravam uma palavra pois o sorriso cúmplice de ambos fazia perceber que o desejo era imenso e que não havia tempo para palavras de circunstância.

O beijo era um ritual iniciático, longamente encenado, um preliminar absoluto em que o silêncio era apenas quebrado pelos suaves murmúrios de ambos e prolongado tanto quanto fosse possível proporcionando que os seus corpos reagissem de forma ondulante e sensual. Procuravam os lábios um do outro como se quisessem engolir-se, numa sofreguidão avassaladora, ora entrelaçando lentamente as suas línguas ora permitindo que o outro penetrasse profundamente de forma a se oferecerem mutuamente.

Joana gostava de sentir que provocava em Filipe uma erecção quase imediata e serpenteava o seu ventre procurando transmitir esse prazer para o seu próprio corpo que oferecia na ânsia de poder ser possuída de seguida. Ele aproveitava estes momentos para a agarrar com força, puxando-a para si e fazendo escorregar as suas mãos até às suas nádegas que apalpava com furor progressivo, utilizando os seus dedos para penetrar com sensualidade nesse espaço mágico que as separava, descendo ao fundo das suas costas e entalando-os até que lhe atingisse o sexo. Ela, por sua vez, procurava-o, mexendo-lhe no peito firme que Filipe cuidava em diários exercícios matinais de modo a evidenciar um corpo elegante que mantinha desde que tinha estado no serviço militar e que pretendia enaltecer como modo de se insinuar junto dela. Acariciava-o frequentemente e gostava de o fixar olhos nos olhos quando se decidia agarrar-lhe o sexo. Era um sentimento de posse que gostava de demonstrar, para se consolar pessoalmente, como para dizer: És meu!

Joana era aparentemente uma mulher decidida, muito activa na sua vida quotidiana e transbordando energia, pois executava várias tarefas durante o dia, guiando de um extremo ao outro da cidade, atendendo chamadas e enviando mensagens através dos dois ou três telemóveis que trazia consigo, tentando acudir a todas as solicitações dos filhos e dos pais que recorriam a ela sistematicamente. Dedicara-se inteiramente à sua família nuclear mas não tinha uma carreira, uma profissão, nem sequer um emprego fixo o que lhe permitia estar livre para se entregar aos permanentes encontros que mantinha com Filipe. Procurava e necessitava destes momentos de luxúria pois representavam a satisfação das suas mais íntimas fantasias o que praticava com assiduidade pois encontrava neles um modo de estabilizar o seu débil casamento.

Filipe era mais velho cerca de quinze anos e prestara-se a ser o seu amante ao longo dos anos decidindo manter essa relação para poder dedicar-se à sua profissão que desempenhava com empenho e audácia. Era um reputado artista que utilizava a fotografia como meio e tinha trabalhado durante muitos anos para a publicidade, fotografando todos os temas, especialmente o retrato. Foi numa dessas sessões que conhecera Joana e em que fixou o seu sorriso e os seus belos dentes, quando fora seleccionada para ser fotografada para uma campanha de um dos seus clientes. Desde então, mantinham uma relação diária que começava cedo com uma chamada telefónica logo pela manhã e, invariavelmente, com uma mensagem “Adoro-te” ou “Obrigado” ao cair da tarde antes de regressar a casa para desempenhar o papel da mãe extremosa e mulher dedicada.

Joana despia-se rapidamente para que Filipe a pudesse beijar e mordiscar os bicos dos seus peitos e lhe metesse a mão entre as pernas, proporcionando-lhe um prazer progressivo que aproveitava largamente. Sabia que ela compararia aqueles momentos em conjunto de forma bastante melhor do que aqueles em que o fazia solitariamente. Ele mexia-lhe com os dedos docemente, acariciando-a com mestria, excitando-a. Ela queria também saborear o corpo de Filipe e tinha aprendido com ele o sentido do tempo e a importância da noção de “duração” na prática da fotografia agora transposta para a sua relação amorosa, assim como a diferença entre “beleza” e “sublime”, a propósito das frequentes referências àquela relação que gostavam de considerar como romântica.

Filipe pensava que tinha conseguido devolver-lhe a auto-estima necessária para que ela se sentisse “mulher” depois de alguns anos de um casamento que mantinha sem qualquer interesse com um oficial da marinha que passava semanas embarcado e que se dedicava ainda, nos tempos livres, a jogar ténis para recuperar os dias passados no mar.

Joana tinha construído um modelo de vida baseada numa ilusão, organizada em torno de uma ideia fictícia de felicidade em que confundia a “realidade-real” com a realidade-imaginada” transformando-a numa simulação organizada e que lhe permitia utilizar a força dos contrários, presença e ausência, verdadeiro e falso, real e imaginado, a favor de si própria, tal como Madame Bovary.

«Gostava do mar apenas pelas suas tempestades e da verdura só quando a encontrava espalhada entre ruínas. Tinha necessidade de tirar de tudo uma espécie de benefício pessoal e rejeitava como inútil o que quer que não contribuísse para a satisfação imediata de um desejo do seu coração - tendo um temperamento mais sentimental do que artístico e interessando-se mais por emoções do que por paisagens».

Agora experimentavam os limites da paixão, entregando-se e oferecendo-se na convicção de que, assim, provariam o amor um pelo outro. Ele tinha-lhe proporcionado os momentos de maior prazer da vida o que a levou a afirmar-lhe, num momento de rara confidência, que tinha tido com ele o primeiro orgasmo. Com ele libertava-se progressivamente de falsos pudores e procurava encontrar pleno prazer quando se excitava ao limite, deixando-se cair exausta sobre a carpete.

Gostava de o possuir enquanto ele a penetrava de modo a excitá-lo com a sua massagem e proporcionava a Filipe ocasiões informais, aliciando-o para outras partes do atelier e, agora também da sua casa, para se colocar em posições que permitissem entrelaçar-se de forma mais erótica e que não lhe recordassem as fastidiosas e entediantes aproximações que o marido, poucas vezes aliás, lhe dedicava.

Os minutos tinham passado lentamente após terem feito amor no sofá e o olhar de Joana ter vagueado pela sala, tentando fixar na sua memória todos os pequenos detalhes, quando resolveu murmurar: Tenho uma coisa para te dizer, Filipe! Disse com ar sério. Parto amanhã para Barcelona aonde vou viver enquanto C. estiver a cumprir uma comissão de serviço! Não te poderei ver mais!

Joana vestiu-se apressadamente e nervosa atendeu o telemóvel. Sim, estarei aí dentro de cinco minutos! Estou quase a chegar! Despediu-se de Filipe sem o beijar e saiu a olhar para o chão.

Ao final da tarde, Filipe recebeu uma mensagem: Adoro-te!

Filipe Martins

Sexo e Orgasmo

Joana gostava de ser possuída. Dizia-o frequentemente a Filipe que lhe enfiasse bem fundo e que se viesse ao mesmo tempo que ela. Gostava de lhe meter a mão nas calças, provocá-lo e sentir que se entesava à medida que ela o acariciava. Provocava-o, masturbando-o progressivamente e olhava o seu falo com verdadeiro sentido de posse. Via-se que se concentrava neste acto e que lhe apetecia ser também apalpada.

Tinha a ousadia de desabotoar as calças de modo que Filipe lhe pudesse enfiar a mão entre as pernas e a excitasse. Ficava, de imediato, bastante húmida e se não se decidisse a chupá-lo, colocava-se de modo a ser penetrada.

Sentia-se nas nuvens à medida que o balançar dos corpos proporcionava a ambos um prazer nunca antes imaginável. Agarrava-o com força de modo que fosse quase brutal a penetração. Gostava da sua virilidade e ofereciam-se mutuamente. Perdia a cabeça, o momento era vertiginoso, as palavras soltavam-se e gritava: «Fode-me! ».

Tinha prazer ao sentir que aquele homem que estava à sua frente podia ser seduzido. Agora, diante de si, provocava-o levantando lentamente a saia e Filipe percebeu que ela gostava e pretendia excitá-lo antes que ele a tocasse. Ele enfiou a mão nas suas cuecas, acariciou-lhe o ventre e rodopiou os dedos no anterior dos lábios carnudos e macios. Sentiu-a já completamente húmida. A ansiedade era grande, a volúpia enorme. O seu desejo ultrapassava tudo o que imaginava quando o marido se servia dela.

Filipe lembrou todo o processo de sedução que ela tinha utilizado para, enfim, visitar o seu estúdio. Tinha recebido um sms com uma fotografia de uma jóia de lapela, um broche, uma aranha em ouro coberta de diamantes, com um comentário. «Estou apaixonada por esta aranha. Não acha que é um acto artístico comprá-la?». Filipe respondeu-lhe: «Consegue adquirir sempre os seus objectos de desejo? Quem dera…». Joana ripostou: «Tem razão. Adquirir não é preciso. Navegar é preciso…». Ela imaginou-o Ulisses.

Agora, enquanto olhava fixamente para ele, disse: «Quem dera ser Penélope!». E, assim, veio-se.

Filipe Martins (extracto de livro a publicar la Donna è Mobile)

Curso de escrita Erótica na Escrever Escrever

A sensualidade da escrita. O arrepio nas letras de cada palavra. O erotismo que está em cada um de nós sussurra-se ao ouvido, ou desenha-se na Escrever Escrever. Em segredo, entre os lençóis da discrição.
Numa carta de amor (e de sexo), num conto, num blog, em revistas, num livro, a volúpia está nas linhas (e nas entrelinhas) da ponta dos dedos, nos silêncios e nos gemidos tímidos ou exuberantes; sobretudo na coragem que temos para nos despir em palavras e surpreender-nos a nós mesmos e ao nosso objecto de amor, paixão, sexo. Depois de ler ou reler o erotismo dos outros, escrever a sua própria intimidade – com o poder total sobre a quem permite a leitura de tal segredo.

Para Quem
Para maiores de 18 anos, com círculo vermelho em todas as sessões.
Para todos os que tiverem curiosidade de explorar a sua sexualidade, por escrito.
Para quem gosta de fantasiar sobre o corpo e as relações, para solteiros, casais, do sexo oposto ou do mesmo sexo. A confidencialidade e a exposição pessoais dependem inteiramente da vontade de cada participante, sem forçar entrada no mundo íntimo de ninguém – é este o ponto de partida, mesmo sem saber até onde chegaremos.
Para surpreender o parceiro ou parceira, antes do corpo, nas palavras; para se surpreender a si mesmo, a ler e a escrever, a sentir e a fazer sentir.

Objectivos do Curso
- Ler e analisar textos da escrita erótica mais conhecida;
- Aumentar o vocabulário erótico e descobrir possíveis encenações sexuais na escrita;
- Praticar a escrita erótica e sexual – sensual.